domingo, 25 de maio de 2014
QUANTA FELICIDADE EU AGUENTO?
* Te desejo toda felicidade que puder aguentar * Foi com esta f rase que uma pessoa que gosta de mim encerrou seu e-mail, e fiquei petrificada diante do computador, um pouco pela explosão de gentileza de alguém que nem conheço, e outro tanto pela contundência que me fez pensar: quanta felicidade eu aguento?
Desde que lancei um livro com a palavra *feliz* no título ( a coletânea de crônicas *Feliz por nada*, de 2011 ) que respondo até hoje a uma infinidade de entrevistas com esse monte: o que é afinal, ser feliz?
Bom, quando estou triste, estou feliz. Não sei se isso responde.
Felicidade não tem a ver com oba-oba, riso frouxo, vida ganha. Isso é alegria, que também é ótima, mas que não tem a profundidade de uma felicidade genuína que engloba não só a alegria como a tristeza também. Felicidade é ter consciência de que estar apto para o sentimento é um privilégio, e que quando estou melancólica, nostálgica, introvertida, decepcionada, isso também é uma conexão com o mundo, isso também traz evolução, aprendizado.
Feliz de quem cresce. Mesmo aos trancos.
Infelicidade, ao contrário, é inércia. A pessoa pode passar a vida inteira sem ter sofrido nada de relevante, nenhuma dor aguda, mas atravessa os dias sem entusiasmo, anestesiada pelo lugar comum, paralisada por seu próprio olhar crítica, que julga os outros sem nenhuma condescendência. Para ela, todos são fracos, desajustados ou incompetentes, e não sobra afetividade nem para si mesma: se está sozinha ou acompanhada, tanto faz. Se há a expectativa de uma festa ou a iminência de uma indiada, tanto faz. Essa indiferença em relação ao que os dias oferecem é uma morte que respira, mas, ainda assim, uma morte.
Eu reajo, eu me movo, eu procuro, eu arrisco - essa perseguição a algo que nem sei se existe é uma homenagem que presto à minha biografia. Nada me amortece, tudo me liga, tanto aquilo que dá certo como também o que dá errado. Felicidade é uma palavrinha enjoada que remete só ao bom, mas dou a ela outro significdo: é uma inclinação abrangente e corajosa pra a vida, que nunca é só boa.
Já a infelicidade é uma blindagem contra o encantamento, é negar-se a extrair das miudezas o mesmo feitiço que as grandezas proporcionam. Eu celebro o suco da laranja matinal, o telefonema de uma amiga, a saudade que eu sinto de algumas pessoas, o sol caindo no horizonte, a luz que entra pela janela do quarto ao amanhecer, a música que escuto solitária e que me remete a uma inocência que já tive - e que pelo visto ainda tenho. Celebro o já vivido e o que está por vir, as risadas compartilhadas e o choro silencioso, e todas as perguntas que um dia talvez sejam respondidas.
Como esta: quanta felicidade eu aguento? Não sei. Que venha. Recusa-la é que não vou.
MARTHA MEDEIROS
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